Trump Não É o Aliado Que a OTAN Quer, Mas É o Que Ela Precisa
A Europa não gosta dele, mas seus filhos vão lhe agradecer
A ameaça de Trump de deixar os países da OTAN que não cumprem com suas metas de gastos militares se virarem sozinhos expôs um fato inconfortável: as elites políticas globais se indignam mais com a retórica populista recente do que com os perigosos resultados de seus fracassos de longa data.
Para provar esse ponto, os líderes da OTAN juraram vingança, prometendo fazer o que deveriam estar fazendo já há 75 anos: aumentar os tais gastos militares. Os globalistas chamam isso de ‘estratégia de contenção de Trump’. Trump chama isso de missão cumprida.
Cada presidente dos EUA desde G.W. Bush se engajou em um ‘diálogo construtivo’ a respeito dos insuficientes gastos de defesa da Europa, apenas para receber como resposta promessas tão vazias quanto os pentes das metralhadoras que os europeus nunca compraram. As sofisticadas economias do Ocidente, com seus PIBs inchados pelos dividendos da paz, parecem inerentemente incapazes de arcar com suas próprias responsabilidades, não importa quão sombrias sejam as sombras que se esticam em suas fronteiras.
O estilo ‘bad cop, worse cop’ de Trump, ridicularizado por muitos, talvez seja a única linguagem que o pávido colosso da OTAN entende. Minha única frustração é que se essa estratégia fosse adotada por Joe Biden, seria ainda mais eficaz; a julgar pela forma como os aliados da OTAN foram receptivos às garantias de Obama sobre as supostas intenções pacíficas da Rússia em 2012.
Os métodos não ortodoxos de Trump já forçaram questões como a segurança das fronteiras e os riscos da dependência energética da Rússia — e dependência comercial da China — para a frente do diálogo global. Sua abordagem, desimpedida pelas delicadezas da diplomacia, tem um jeito singular de incutir verdades na consciência coletiva que, com o tempo, até seus detratores mais ferrenhos acham difícil ignorar.
Sufocada pelos gritos de elites ultrajadas jaz uma verdade inegável: em sua curta existência a doutrina Trump, de muitas maneiras, forçou uma reavaliação das políticas de longa data que deixaram o Ocidente vulnerável, algo que décadas de diplomacia gentil e educada não conseguiram.
Jens Stoltenberg, o pacifista há muito adormecido ao volante da OTAN, denunciou os comentários de Trump, mas não uma Europa que perdeu a vontade de se defender (senão de viver mesmo), tendo dificuldade em simplesmente colorir dentro das linhas da estratégia de segurança da OTAN.
A dependência do Artigo 5 como primeira linha de defesa da Europa é tão equivocada quanto perigosa, não apenas para a OTAN, mas para a segurança global. Com um PIB onze vezes maior que o da Rússia, os líderes europeus deveriam ser espinafrados diuturnamente por sua falta de valores civilizacionais, ignorando seus compromissos de defesa e o destruidor custo de oportunidade das insanas políticas ambientais e de bem-estar social adotadas no continente.
A pergunta que os cidadãos europeus deveriam estar fazendo não é se o líder dos EUA viria em sua defesa no caso de uma invasão russa, mas se seus próprios líderes o fariam.
A noção de que a política de defesa da Europa é de uma imprudência sociopata não é um exagero. Eventos recentes, como a vergonhosa falha do principal porta-aviões do Reino Unido, retirado do maior exercício militar da OTAN em décadas; e o exército alemão sendo obrigado a treinar com vassouras, no lugar de metralhadoras, devido à falta de equipamentos, destacam a falta de prontidão das imaginárias forças militares européias.
A falta de entusiasmo popular por carreiras militares levou países como Letônia, Croácia, Dinamarca e até o Reino Unido a considerar reinstituir o serviço militar obrigatório. Mas, a desordem incapacitante da estratégia de defesa da Europa vai muito além da prontidão militar. Recentemente, Suécia e Finlândia decidiram aderir à OTAN a toque-de-caixa e por capricho, a indústria de defesa holandesa está sendo arrastada pelos tribunais, a Irlanda está casualmente flertando com o fim de sua neutralidade e a Polônia está considerando abertamente a aquisição de armas nucleares — movimentos que mudam significativamente a estratégia de segurança do velho continente.
Neste contexto, torna-se evidente que a mensagem de Trump não era direcionada aos membros da OTAN no leste europeu, que, com exceção da Bulgária, todos cumprem o limite mínimo de gastos de defesa de 2% do PIB. Também é evidente que Putin não teria como contornar essas nações para atacar os ‘aproveitadores’ como Itália ou Espanha.
França e Reino Unido, equipados com arsenais nucleares, presumivelmente possuem a capacidade de retaliar contra Moscou no evento de um ataque. Portanto, a mensagem de Trump parece ser particularmente focada na Alemanha, o titã industrial do continente e o mais notável aproveitador da OTAN.
O problema é que a OTAN foi criada, em parte, para manter a Alemanha desmilitarizada. E, começando pela falta de um efetivo militar até a desindustrialização aguda que aflige o país, recuperar a capacidade de defesa da Alemanha parece ser uma tarefa insuperável. Recentemente, o principal fabricante de armamentos alemão indicou que poderia levar até uma década para repor apenas a munição utilizada na Ucrânia até agora.
A OTAN proporcionou aos Estados Unidos benefícios sem paralelo em termos de segurança e comércio. No entanto, foi estabelecida em uma época em que os EUA representavam 50% da economia global, enquanto agora representam menos de 25%. Por anos, o establishment americano aceitou (e até promoveu) o status quo em que os maiores países europeus negligenciavam seus gastos militares, reconhecendo que uma Europa autossuficiente poderia diluir a influência americana no continente.
A crítica à doutrina Trump, que a descarta como uma provocação isolacionista que não oferece nada de novo ou benéfico para a geopolítica, ignora os resultados que seus métodos não-ortodoxos alcançaram ao estimular revisões significativas de políticas em outras áreas.
Trump não está sinalizando que os EUA serão menos confiáveis militarmente no futuro. Pelo contrário, instar a Europa a assumir maior responsabilidade por sua defesa é a melhor maneira de promover uma estratégia de dissuasão eficiente para enfrentar os complexos desafios geopolíticos deste século.
Décadas de uma ‘ordem internacional baseada em regras’ falharam em incentivar a Alemanha e outros a se engajar nessa tarefa. Com Putin arrastando o mundo para mais perto da Terceira Guerra Mundial, essa falha foi exposta como a maior ameaça ao futuro da humanidade. E restou a Trump, inadvertidamente, o papel do catalisador de que a Europa precisa para romper sua letargia defensiva e garantir um futuro mais seguro e sustentável.
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